Em meio à dança das cadeiras na diplomacia argentina, o governo de Javier Milei retirou do cargo também a sua chanceler, a economista Diana Mondino, uma das ministras que no início de governo tinha maior projeção, drenada ao longo dos últimos meses.
O novo chefe do Ministério das Relações Exteriores será Gerardo Werthein, hoje embaixador argentino nos Estados Unidos. Milei busca ter Washington como aliado de primeira hora, e Werthein era um dos protagonistas da estratégia do ultraliberal.
A queda de Mondino, já desgastada, teve relação com o recente voto argentino na ONU, em Nova York, pelo fim do embargo americano a Cuba. O clima ruim ficou evidente com um compartilhamento do próprio presidente no X nesta quarta-feira (30).
Após o anúncio da troca na pasta, ele compartilhou mensagem de uma deputada conservadora que dizia: “Orgulhosa de um governo que não apoia e nem é cúmplice de ditadores”.
Depois, um comunicado da Casa Rosada oficializou a saída: “Nosso país se opõe categoricamente à ditadura cubana e se manterá firme na promoção de uma política exterior que condene os regimes que perpetuam a violação dos direitos humanos e das liberdades individuais”.
Mais, o governo anunciou o que chama de uma auditoria de todos os profissionais da chancelaria, “com o objetivo de identificar promovedores de agendas inimigas da liberdade”. É uma fiscalização do corpo de funcionários públicos nunca antes vista no período democrático.
Ao longo dos últimos meses Milei implementou um clima de caça às bruxas na chancelaria. Há poucos dias, enviou carta a todos os seus diplomatas cobrando alinhamento a seus ideias de liberdade, entre eles a oposição a tudo que tem relação com a Agenda 2030 da ONU.
O clima interno era de tensão, agora escalado.
A estratégia da diplomacia comandada pela chanceler cessante na ONU teria sido a de reunir apoio para quando precisasse de votos para reivindicar a soberania argentina pelas ilhas Malvinas, dilema histórico de Buenos Aires com Londres, relatou o La Nacion.
Invariavelmente o fim do embargo à ilha caribenha recebe apoio de peso na ONU, com o Brasil sendo um dos países a puxar essa agenda. Mas, para a cartela de política exterior de Javier Milei, atuar ao lado do regime comunista seria inadmissível.
Mondino é tirada do governo a poucos dias da cúpula do G20 no Rio de Janeiro e cerca de um mês antes de mais uma cúpula do Mercosul, esta em Montevidéu, no Uruguai. Ao primeiro evento, causando surpresa, Milei disse que vai comparecer. Ao segundo, ainda não se sabe.
Era ela quem invariavelmente representava a diplomacia argentina em eventos nos quais esperava-se o presidente, como foi o encontro do Mercosul em Assunção há alguns meses.
Coube à economista defender uma agenda conservadora contra qualquer debate de gênero ou justiça social, que a Casa Rosada tem levado a todos os organismos multilaterais dos quais faz parte.
Em extensa entrevista à reportagem em abril passado, Diana Mondino defendeu a relevância da relação bilateral Brasil-Argentina, ainda que os presidentes Milei e Lula (PT) não se falem. Ela tinha relação próxima com o embaixador brasileiro em Buenos Aires, Julio Bitelli, e buscava visão mais pragmática sobre alguns temas.
Do mercado privado, Mondino não tinha nenhuma experiência diplomática ao assumir o cargo no governo Milei. Da “universidade dos liberais” na Argentina, ela foi enviada ao Brasil ainda antes de Milei ser empossado para colocar panos quentes na relação estremecida entre os dois países após Milei disparar críticas contra Lula na campanha.
Folha: Folha de S.Paulo